domingo, 24 de junho de 2018

baú - uma vida incomum como qualquer um 56





baú


Comunicações não violentas. Gostei da ideia. Lembra gentileza gera gentileza. Parece, intuo, começa na escuta atenta, no cultivo do afeto na conversa.  Passa pela sutileza do gesto, do tom, do olhar. Acho que entendi. Descubro, agora, como é difícil colocar em prática. Desconfio inda não sei direito comunicar-me não-violentamente comigo mesmo.

*
Mexo no baú.

Depressão. Contratos, distratos, reversos fazem com que à terra eu desça. Partes de meus universos confundem minha cabeça. E bem na moda atual, se a economia vai mal, se ultrapasso a fronteira - e mais passo falso dou - adeus situação financeira. Profissional liberal, frila, do biscate, camelô. À mineira disfarçado, favelado já estou.

Desemprego. Não sei se insisto, se só respiro e despisto, se telefono aos amigos. Ou se em casa me curo e, pelas ruas, alentado, novos empregos procuro. Tudo atrasado. Impostos, luz, gás, banco, dentista, analista. O dinheiro onde jaz? Almoço ali, cafezinho como um luxo. Belisco aqui, a tragada vem no fluxo. Ai, ui, ai. Quero mamãe, quero papai.

Imenso vazio. Mais do que falo, mais do que penso, sou o que sou, sou é imenso. Faço que fico, falo que vou, baixos e picos, sou e não sou. Em cada quebrada, sou tudo, sou nada. Sinto não sim, vôo não vou, tenso não sonho, sim não eu sou. Num momento só cagaço, o pavor do mais medonho, dúvida do faço não faço, choque do ter e do ser, o real a me chamar do sonho. Triste alegria, dor e prazer. Aqui, lá, em todo lugar, pulso, pulso no meu campo. Surjo, desapareço, tamanho, presente amplio o finito, o infinito acompanho.

Pedra Rolante. Rodo e rodo, a mesma pedra, todos caminhos. De qualquer modo,  se não pedra, espinho. A minha pedra, sou eu sozinho. Sou eu quem medra. Eu sou a pedra.

Encenação. Não sou o que penso que sou. Não sou o que digo que sou. Sou o que sinto que sou. Pressinto assim uma farsa, quem sabe já sente faz bem, defendo minha falsa imagem, só com minha imagem falsa.

Morte. Pobre, fraco, seco, torto. Gago, velhaco, sexo morto. Humor, só do negro. Careca, banguela. Não sinto apego, eu quero uma vela. Não cheiro nem fedo, o corpo é um gelo. Nem coragem nem medo. A cuca, um novelo. Frio na alma, nada tem gosto. Nem agito nem calma, destino já posto. Parto de novo. Agora, no escuro, volto a ser ovo do meu próprio futuro. Sensação de carinho, os sons quase mudos. Negrume, morninho, esqueço de tudo.

Quem sabe. Pra quem, desde criança, cria necessidades, difícil pode ser a mudança, quanto maior a idade. Aquela que, desde o ninho, pra quem o que for será, terá mais fácil caminho. Ou rumo incerto, sei lá. O que é certo ou errado, que crime merece castigo, onde vou, pra que lado, eu não sei, sabe o amigo?

Meus filhos, um lado vivo, um outro morto, ativo, torto, sou seu modelo. Como não sê-lo, sendo seu ninho. Quanto aos caminhos, selecionemos os mais amenos. Sei que não devo gerar conselhos, sem mais nem menos, aos meus espelhos.

*
Fofocas. Esta ouvi do Dr. Fritz. Até hoje me ajuda medir as palavras...

Joaquim falou pro Pedro: tenho algo pra lhe contar sobre a Maria...
Pedro pergunta pro Joaquim: o que você vai me falar, é bom pra Maria?

E o Joaquim: não...
Pedro, de novo, pro Joaquim: e é bom pra você?

O Joaquim: não...
O Pedro: e pra mim, Joaquim, é bom pra mim?

O Joaquim: não, não...
Pedro pede: então não me conta não...

*

Alforria. Sou governador, sou presidente, do meu amor, da minha mente.  Bom dia todo dia, boa noite toda noite, boa vida toda vida. Escolhas, querida.






Luiz Fernando Sarmento









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