quinta-feira, 23 de maio de 2024

115 a emoção emerge





115


A razão mora na mente, imagino. A consciência, fora de mim, do meu corpo.


a emoção emerge



“… a raiva, filha do medo, mãe da covardia…”, em sua canção Chico Buarque me lembra.


Sinto. A raiva traz agressividade, o sentimento de raiva cutuca o movimento bruto, o ataque a quem provoca o medo. Falo de mim, percebo em mim. Como em mim, intuo em outros. As origens de meus medos incluem quem colabora, participa da feitura do mal que me faz mal e me provoca medo, que me desperta raiva.


Tenho medo de quem me faz mal. Quando sinto o mal, tenho medo. Tenho raiva do que, de quem me provoca medos.


Minha consciência de origens de minhas raivas me traz alguma compreensão e me acalmo. Tenho administrado minhas raivas e as agressividades que minhas raivas cutucam. Facilita – contenho minhas agressividades – eu bem cuidar de mim. Até agora, tem sido simples assim. Contenho covardias dentro de mim. Evito, não pratico covardias.


Penso, também, naqueles que me fazem mal. Não sei se nasceram assim, ruins como me parecem. Não sei até porque quase nada sei das origens dos meus sentimentos. Não sei, de todo, como construo sentimentos, algo assim, em mim.


O que me faz mal inclui o que faz mal a outros. O que me faz bem inclui o que faz bem a outros. Sinto, “eu sou porque nós somos”. Ubuntu. Intuo, quase sei, sou um e sou todos, todos somos todos, todos somos um.


Percebo assim. Um sentimento ali deflagra um sentimento aqui. Meu corpo é assim, um movimento ali deflagra outro aqui. Sistemas, sistêmicos. Em tudo, além das chamadas coisas práticas, o etéreo.


Aprendizado tosco, este meu. Mas, sinto, só posso acreditar no que sinto. O que sinto é fruto do que vivo. Como tenho me sentido bem neste caminho, mergulho e me alegro.


Talvez sim, um sinal. Antes de sair de dentro de mamãe, passei lá algum tempo que não lembro. Aqui fora foram meses. Cresci, tipo semente, até ser gente. Isto fisicamente. No mais – sei lá, mental, emocional, espiritualmente... – as histórias que me conto dependem do meu estado e da minha memória. Certeza nenhuma. Inda mais agora, ao me aproximar de outras realidades – que também não sei se reais, imaginações, sonhos, fantasias.


Já fora, na escola, aprendi das razões. Estas coisas, ler, escrever, raciocinar. Senti, mas pouco percebi do que aprendi no sentir. A razão mora na mente, imagino. A consciência, fora de mim, do meu corpo.


Sentimentos têm vindo, como então. Vem e vão. Alguns marcam e ficam e carrego vida afora. Meu corpo emocional abrange os sentimentos, estes mistérios despertados, assim, aparentemente sem mais nem menos.


E mistérios tem mais, muitos mais. Os sonhos, o pulsar, o ar, o éter, a água. A folha, o bicho, o mar. O fixo, o solto, estrela, origem, destino, vagar. Cada coisa, se aprofundo, no fundo, mistério.


Pego uma folha, amplio minha visão – com microscópio ou não – e surgem mundos. Se mais mergulho, chego às células, aos átomos, a vazios. Tudo tão semelhante ao que vejo no céu – com lunetas ou a olho nu. O menor semelhante ao maior. O que é grande, também pequeno. O pequeno, grande.


O sentimento é a emoção que vivo, se percebo. Se não percebo, nem sei o que sinto, nem sei o que vivo. Sentimento me remete a emoção. Emocionado, vivo.


Só eu, talvez – como de si, cada um – possa falar de mim, dos meus sentimentos. Ninguém vive a vida que vivo. Só eu, um comum homem incomum, sente o que sinto, como qualquer um.


Meu espiritual vem da vivência. Vivo emoções, pra mim, intensas, despertadas por meus sentidos – os que conheço, os que nem sei. Mas só vivo quando percebo e me permito.


Bom é que meu corpo carrega minha memória, minha história. Mexo aqui, acesso ali. Balanço o corpo, lá vem memória. Mastigo melancia, lembro de vovô. Um biscoito voador, lá vem Salinas. Um seio, oi mamãe. Uma cacunda, a benção, papai. Em cada lembrança, regrido, revivo na emoção. Volta e meia, despertas, lembranças de criança.


Pois é, assim tem sido. Tenho acreditado no que vivo, no que percebo. Assim nasce minha fé. Quanto mais vivo, mais sinto, mais fé tenho. No mais, são dúvidas. Na dúvida, fé não tenho. Sabe quem sente.


Racionalizo quase tudo. A emoção emerge e prevalece.


As realidades me ensinam. Depende um tanto do meu olhar, a percepção da realidade. E meu olhar, sinto, depende do que sinto. E eu acredito, tenho fé no que sinto. Meu olhar vem de minha fé. Assim, tudo misturado, mas claro. Claro o que é claro. O que não é claro, mistério.


Emerge e prevalece, a emoção. Define minha visão, o que sinto. Nasce o desejo, aprender a linguagem dos sentimentos, descobrir as origens dos sentimentos. Usufruir desta sabedoria.


Esta fé nasce da certeza do ter sentido aquilo que vivi e me tocou e me marcou.


Desconfio, quase certeza. Sou, como cada um, incomum. Se olho de perto, se olho de longe, o mesmo. Todos somos um. Somos todos um.






 

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