quarta-feira, 3 de julho de 2024

87 só vivo o que percebo do que sinto

 



Escrevi há alguns anos...

87


Tantos momentos vivi sem prestar atenção aos meus sentimentos que nem sei o que de mim perdi.


só vivo

o que percebo

do que sinto



Descobri, quando falo de mim, do que vivo e vivi, sou mais ouvido do que quando falo de outra pessoa.


Descobri, também, quando expresso o que sinto, me sinto melhor.


Agora, aprendo, há diferenças enormes entre eu expressar minha opinião – meu pensamento – e eu expressar meu sentimento.


Tudo isto tenho aprendido a colocar em prática, estimulado pelo bem-estar que me provoca.


Tudo novidade e aprendizado. Como resultado, ontem mesmo, o diagnóstico da terapeuta confirmou o que sinto. Meu corpo fala. Ela cutucou aqui e ali e, surpresa boa pra nós dois, nada fora de ordem, nenhuma dor, nenhum mal-estar naquele momento.


Tem dado certo comigo, isto, do caminho do coração. Sinais bons têm sido as ausências de doenças e remédios – atualmente nada de mal sinto. E nada tomo, com exceção dos homeopáticos.


Neste caminho tenho encontrado dificuldades. Inicialmente, a dificuldade de aprender sobre mim mesmo. Pra isto, agora sei, tenho que estar atento ao presente. Faz sentido pra mim: só vivo, mesmo, o que percebo do que sinto.


Hoje sei. Tantos momentos vivi sem prestar atenção aos meus sentimentos que nem sei o que de mim perdi.


Mas não me engano. Novas oportunidades surgem a cada momento. Tudo aprendizado, tudo novidade, tudo como primeira vez.


Quando algo me incomoda, reajo. Se critico a atitude de alguém que me incomoda, se dou conselho – como se soubesse mais do outro que ele próprio – sou ouvido com restrições, atritos eventuais. Mas se falo do meu sentimento – tristeza, raiva, mágoa, alegria... – sou melhor escutado.


Os pensamentos que emito podem ser criticados por quem ouve. Podem ser diferentes, dessemelhantes, nossos pontos de vista. Mas os sentimentos que expresso, não. Só eu sei do que sinto. Ninguém poderá dizer o que eu sinto ou não sinto.


Este tem sido meu aprendizado. Distinguir pensamentos de sentimentos.


*

Quando falo sinceramente de mim, falo do que vivencio, experimento, sinto. Quando falo do outro, falo do que penso, imagino, não do que vivi. Não tenho experiência de viver a vida do outro. Corro o risco de errar, quando falo do que não vivi.


*

A linguagem do pensamento, aprendo, é uma linguagem indireta. Expressa, intuo, a razão.


A linguagem do sentimento, aprendo, é uma linguagem direta. Expressa, intuo, o essencial, a emoção.


*

Surpresa boa, ler Amor e Sobrevivência, de Dean Ornish. Ele fala dos caminhos do coração, da intimidade, da solidão. Alguma coisa mexe comigo, confirma o que, há tempos, tateio e descubro cá dentro.


*

Os cuidados com meu espírito têm sido facilitados pelos cuidados com meu corpo. Sou fruto do que como. E do que boto pra dentro com o que vejo, ouço, toco, cheiro, falo. Além do que penso e sinto.


Sinto. Se percebo, vivo. Se não atento, não percebo, não vivo. Cabe a mim – como a qualquer um – escolher a vida que vivo.


*

Salinas, meio que fotografia viva na parede da minha memória. Lá, nasci em 1946, terra natal de papai. São boas, e difusas, as lembranças. Devagarzinho, noto. Salgada terra que deixa marcas no que dela sai. Ali, tempos imemoriais, sonho, o mar virou sertão.


Aos quatro anos e meio, com a família, vim pra Montes Claros, terra natal de mamãe. Aqui vivi minha segunda infância e adolescência, perdi um tanto de minha inocência, ganhei sabedorias, tristezas, alegrias. Vagas lembranças profundas. Aos 16 anos, em 1963, estudo e solidão, Belorizonte. Voltei.


Em 1965 fui pra Brasília, universidade e trabalho. Desde 1971, a maior parte dos meus tempos morei no Rio. Nos anos 70 mergulhei rapidamente em outros mundos, Amsterdã e Londres. Nos anos 80, Moçambique. E, agora, mochila de novo nas costas, aqui, provisório como a vida, em Teresópolis, meio no meio do mato.


A ausência de memória me impele, me obriga viver o presente. Esta atenção no presente tem me facilitado a vida. Tudo aprendizado, novidade. É que, de uns tempos pra cá, descubro, só vivo o que percebo do que sinto. E só percebo o que sinto quando estou atento ao que sinto. Coisa aparentemente boba, mas me reaviva o gosto pela vida.


*

Se mergulho no que me falta, entristeço. Se acolho quem sou, me alegro. Sinto. Se percebo, vivo. Cabe a mim, como qualquer um, escolher a vida que vivo.



* A fotografia,

tirei de um mural, há tempos, 

na cidade do Rio de Janeiro. 


O artista, infelizmente, não sei.






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