segunda-feira, 1 de julho de 2024

89 dinheiro pouco, tenho muito



89


O que eu penso que você sente é só o que penso. Ninguém mais sente o que sinto.


dinheiro pouco

tenho muito



Tantos anos levei para acreditar em mim mesmo. E tão boa a sensação do dever cumprido, isto de gostar de mim do jeito que sou, de cuidar do outro como de mim. Parece poesia. E é. Melhor, assim, a vida simplificada. Rico, mesmo, é quem está contente. Desejo pra cada um, o que pra mim desejo.


Este o desafio, a cada momento: como viver, bem, neste mundo, do jeito que o mundo está sendo…


*

Freud talvez explique o simbolismo das armas. Quem leve namora, ama, não mata. Sei, pelo sentir: quando me amo, fico contente.


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Como eu, imagino, no fundo, cada um sabe do que constrói, das relações que cultiva com o mundo.


Aquele que dá a arma, aquele que a violência invoca, é também responsável pelo que o tiro provoca. Assim como cada um que contribui pro drama, mesmo que não leve a fama… Aquele que faz fofoca é mais um responsável pelo fruto do que a fofoca choca.


Já, em instituições que mal fazem, cada funcionário que contribua pro mal que a instituição traz é responsável também. Não há como fugir de si, cada escolha é própria de quem cada escolha faz.


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Outro dia, li algo assim. O menino fala: – Pai. Se matamos todos os maus, só ficarão os bons... E o pai: – Não, meu filho. Só ficarão os assassinos.


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O que vem à cabeça escorre pelo braço, movimenta a mão que escreve o que me vem à cabeça. Depois, me julgo, me censuro, deixo só o que permito ser lido, apresento a cortina do que sou. Ou não. Arrisco, me entrego ao sentimento que for. Deixo um tanto da edição pro leitor.


Ora sou matéria, ora energia. Ora pensamento, alegria ou lamento, ora noite, ora dia. O crepúsculo como a alvorada, mistura do sim e do não, do que nasce e do que morre, do que é e do que são.


Pois é, assim, em qualquer um, nascem as ideias que geram feituras que mudam o mundo. Seja pro prazer, seja pra dor, o que for.


Cada feito foi, antes, sonhado, pensado. A cadeira, o pião, o copo. O aço, o dedal, a faca, o mutirão. A lata, o sabonete, o abraço, a porrada. Imaginada, antes de se saber, cada letra, palavra, piada. Antes, havia quase nada. A bruta árvore, o riacho, a enseada. O penacho, o mármore, a manada. Coisas, palavras, todo dia são criadas, como se ventos trouxessem ideias, pensamentos.


No meu tempo de menino, tv não tinha. A pé, a cavalo, de bicicleta, um ia, outro vinha. Raridade o rádio, o avião, a multidão. No meu tempo de adulto, de repente, o computador, a internet, o amor ardente, o algoritmo, feiquenius, a falsidade. Tanta coisa, novidade. Permanecem, desde que me entendo como gente, impalpáveis, os sentimentos que geram paralisias e movimentos. Prazer e dor. Os afetos, como sempre, definem, um tantão, o que nossos netos serão. Como tem sido com as gentes.


Nesta constante procura por entender o mundo e a mim, arrisco leituras. Aquelas que me pegam de jeito, despertam meu interesse. Ah! Me surpreendi com o Homo Sapiens – tipo História da Humanidade… E, em seguida, com o Homo Deus – tipo vislumbre do amanhã. Antes, mais fundo, a História Íntima da Humanidade – do que me lembro, a História do mundo contada pelos sentimentos.


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Se, no calor da discussão, falo pra você: – você é burro, chato, bocó!… alimento o conflito, você se sente mal. Mas, se, neste mesmo momento do calor da discussão, presto atenção ao que sinto e falo pra você o que sinto – sinto tristeza, sinto raiva – sua reação será outra, talvez nos desarmemos. Aqui, a possibilidade de aumentar nossa afetividade.


Talvez, até, eu já carregasse em mim os motivos pra discussão. É que, de quando em vez, nem eu mesmo presto atenção ao que sinto…

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O que eu penso que você sente é só o que penso. Ninguém mais sente o que sinto.


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Há anos, senti: pedra rolante. Rodo e rodo, a mesma pedra, todos caminhos. De qualquer modo, se não pedra, espinho. A minha pedra sou eu sozinho. Sou eu quem medra, eu sou a pedra.


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Morte. Pobre, fraco, seco, torto, gago, velhaco, sexo morto. Humor só do negro. Careca, banguela, não sinto apego. Eu quero uma vela. Não cheiro nem fedo.


O corpo é um gelo, nem coragem nem medo. A cuca um novelo. Frio na alma, nada tem gosto. Nem agito nem calma, destino já posto.


Parto de novo, agora no escuro. Volto a ser ovo do meu próprio futuro. Sensação de carinho, os sons quase mudos. Negrume, morninho. Esqueço de tudo.


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Imenso vazio. Mais do que falo, mais do que penso, sou o que sou, sou é imenso. Faço que fico, falo que vou, baixos e picos, sou e não sou. Em cada quebrada, sou tudo, sou nada.


Sinto não sim, voo não vou. Tenso não sonho, sim não eu sou.


Num momento só cagaço, o pavor do mais medonho. Dúvida do faço não faço, choque do ter e do ser. O real a me chamar do sonho, triste alegria, dor e prazer.


Aqui, lá, em todo lugar, pulso, pulso no meu campo. Surjo, desapareço, tamanho, presente amplio o finito, o infinito acompanho.


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O jogo é rápido. Lá fora, cá dentro. Prestenção. É o que me digo.






 

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