quarta-feira, 23 de outubro de 2024

13 mais ou menos um dia




13

Descobri, maduro,

não sou eu que tenho as coisas,

são as coisas que me têm.


mais ou menos um dia


2016

Um tanto, um pouco coleciono o que me vem claro ao coração. Um turbilhão. Bom, me sinto dono de mim mesmo. E compartilho sacações, talvez, com outros corações.

*

Meu Deus, pura empatia, se alegra com minha alegria.

*

Não é que eu não tenha tempo pro prazer. É que escolho outras coisas pra fazer, ser, estar, permanecer, ficar...

*

Que alívio. Minhas escolhas determinam o que vivo.

*

Racionalizo tudo. A emoção emerge e prevalece.

*

E me permito tantas metas… Só não tenho a hora certa.

*

A criança que vive em mim implora: viva sim, viva agora.

*

Será sempre assim, inesperado, o fim?


Posses

Tudo muito bem, tudo muito certo. Reconheço, tanto eu desatento ao tempo… Descobri, maduro, não sou eu que tenho as coisas, são as coisas que me têm.


O carro que não tenho me obrigaria cuidá-lo, guardá-lo, emplacá-lo, mantê-lo. O animal que não tive me pediria atenção, cuidados. O dinheiro requer guarda, controle. O que mantenho nas prateleiras, no guarda-roupas, me pede limpeza, arrumação. Tudo me pede tempo. Se não pede, toma.


Hoje, ainda, como não tenho meu tempo, corro. Na minha infância não soube de faltas até o momento em que, na cidade maior, vi a vitrine. Desejei o que não tinha. E por muitas vezes me angustiei por não me suprir das novas necessidades criadas. Só agora compreendi que o que aparentemente possuo é que me possui. Minhas posses me aprisionam.


Foi bom tê-las – estas coisas que me têm – e agora deixá-las a uma e a outra. Por mim, hoje, só conversaria, escreveria, filmaria, espreguiçaria, deixaria a saudável inesperada vida me levar. Muito do que me impede é minha carência, que me faz querer ser reconhecido, admirado, mesmo eu sabendo que – se minha autoestima depender do olhar de outros – posso eu próprio não me reconhecer. Como diz o Adalberto, o que você quer que eu queira, pra eu querer?


Misturas

Cultura, o que é? Antonio Faundez lembra Paulo Freire e se identifica com o que ele dizia, descobrir uma cultura é aceitar outra cultura, tolerá-la. E afirma que a cultura é mais do que manifestação artística ou intelectual através do pensamento. Sua manifestação mais profunda está nos gestos simples do cotidiano, como os diferentes jeitos de comer, dar a mão, relacionar-se com o outro.


Eu próprio, quando leio Faundez, o escuto impregnado de minha própria cultura. Já não é mais Faundez puro. Somos agora misturados, inclusive a Paulo Freire.



Winnicott dedicou a vida à pediatria e à psicanálise, especialmente a infantil. Fez, nos últimos anos de vida, palestras para os públicos mais diversos. Tudo Começa em Casa é o título do livro póstumo que contém algumas destas palestras. Cada capítulo se encerra em si mesmo. Sua leitura tem me facilitado a vida, um tanto pela melhor compreensão de mim mesmo, outro tanto pela compreensão do outro, mamãe inclusive. E meus lados mãe, pai, filho.







 

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