08
De novo, navio mais barato que avião, doze dias no mar, Europa. Londres, rapidinho encontramos o porão certo da casa condenada.
1973
Alugamos, com Roberto Amaral, um amigo do Rio, um sala e quarto na Barra. Prédio com cento e quarenta e quatro pequenos apartamentos, só nós morando durante a semana. Água potável trazíamos de fora.
Em busca de glória, dinheiro e de não sei mais de que, catálogo telefônico nas mãos, ofereci de porta em porta meu trabalho gratuito a produtoras de cinema. Memória insegura.
Um concunhado que era filho de uma prima de Lucy, mulher de Luiz Carlos Barreto, entreabriu uma fresta. Barreto me acolheu, me deixou à vontade. Durante três meses cheguei cedinho, sai noitinha, mexendo, escutando, atento. Especialmente a partir de informações de Lucy, escrevi um manual de produção de cinema, com tudo quanto é tarefa e controle. Frilança, fiz uma secretaria de produção d’A Estrela Sobe, de Bruno.
Nelson Pereira dos Santos, talvez não se lembre, sem me conhecer, me marcou pela atenção com afeto. A produtora era um centro cultural, vaivém de gente diferente. Dali, fui pra Mapa, como segundo assistente de montagem de Eduardo Escorel e Amaury no Guerra Conjugal, filme de Joaquim Pedro.
Na Mapa, produtora cinematográfica de Zelito Viana, na Urca, rolava no final das tardes uma comida caseira deliciosa e à mesa sentavam os chamados senadores do cinema novo – Cacá, Leon, Jabor, além de Joaquim, Nelson, Zelito, e, olha a memória curta, talvez Glauber. Ali, acredito, o berço da renovada Embrafilme.
No Largo do Machado encontrei Carlos Alberto Prates Correia. Carlos Alberto, minha referência amiga mais forte no cinema, me ensinou ser diretor de produção de seu filme Perdida. Inesquecível viagem. E, na história da Embrafilme, único filme a devolver dinheiro não gasto do financiamento.
1976
De novo, navio mais barato que avião, doze dias no mar, Europa. Londres, rapidinho encontramos o porão certo da casa condenada. North Gower Street, pertinho da Union London University, a ULU, onde – para nosso fraco inglês não nos denunciar intrusos – calados entrávamos, calados almoçávamos e tomávamos banho.
Na casa comunitária da esquina da nossa rua ajudávamos fazer pães integrais. Ana trazia doces indianos deliciosos do restaurante onde trabalhava na cozinha. Eu, não sei como – imagino fazia mímicas – arrumava trabalho por telefone. Pulei de operário ajudante de obra para modelo de escola de desenho. Depois lanterninha e vendedor de sorvete no teatro da ULU. Lia as poesias de Mao em português, comia kebab, batia perna pelo centro da cidade.
Desconfiei serem agentes do DOPS os fotógrafos que clicavam em passeata de protesto contra Geisel, em visita oficial a Londres. Medroso de não poder voltar ao Brasil, arrumamos rapidinho as malas e, seis meses após nossa chegada, voltamos de avião para casa.
Não sei agora a ordem das coisas. Na fronteira de Santa Tereza com o Silvestre, a Equitativa tinha um quê de paraíso – a floresta da Tijuca à janela, gente em busca alternativa como nós, aluguel barato de um apartamento velho por restaurar, uma pracinha com vista de cartão postal da baia da Guanabara.
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