uma vida
incomum como qualquer um 29
emoções de todo dia
À tarde, Jun e o
filho, Mitsuhito, chegam alguns minutos depois das três. Apresento
superficialmente as câmeras gravadoras e lá vamos de táxi em direção à casa de
atendimento comunitário aos pés do Turano, no Rio Comprido.
Mitsu prepara sua
câmera fotográfica, Jun a dvcam, eu a também pequena hdv. Converso com duas
estudantes de psicologia. E com nossa anfitriã, que todo dia ativa a
casa. Chegam algumas senhoras moradoras da comunidade... Depois Alex e Sandra, responsáveis
neste dia pela Terapia Comunitária. Somos em torno de dez pessoas.
Entre os problemas,
a votação maior definiu o escolhido. Uma senhora, em lágrimas, relata seu sofrimento
com as vidas de seus dois filhos. Um, na ilegalidade, foi morto pela polícia. O
mais novo, preso por motivos semelhantes, não retornou à prisão quando foi
liberado para visitar sua família. Permanece ilegal. Enquanto preso, a mãe, mesmo
passando constrangimento, o visitava o tanto permitido. Ela sofre também por
não ser reconhecida e valorizada pelo filho vivo.
Ao final, como
tenho vivido em sessões de terapia comunitária, os abraços, olhares e conversas
traduzem os sentimentos, a solidariedade. A mãe sofredora se declara
confortada, mais animada. Vamos em paz.
No dia seguinte. Na minha formação, uma vez por mês participo de uma
intervisão, sábado inteiro. Pela manhã, muitas vezes, um convidado fala sobre
algo novo para nós.
Anteontem conheci
um tanto de Equipe Reflexiva, uma ideia e prática original de Thomas Andersen. Do
que entendi, enquanto uma família é atendida por um terapeuta, outros
terapeutas observam em silêncio e refletem. Os dois grupos trocam de posições, se
a família deseja. Os que observavam falam entre si das suas percepções,
enquanto a família agora os observa. Finalmente os membros da família fazem seus
comentários. É um processo reflexivo.
À tarde, roda de
terapia comunitária. Alguém apresenta sua dificuldade quanto à presença de público
nas rodas que realiza. Outra fala da sua dificuldade no relacionamento com a
filha adolescente. Esta última foi o tema escolhido, houve um maior número de pessoas que, por se
identificarem com ele, nele votaram.
A mãe detalha,
responde a perguntas, se emociona. Fala da sensação de perda do amor materno, da
vontade de matar, intercala choro e desabafo.
Depois, em
silêncio, escuta experiências compartilhadas por uma ou outra mãe presentes.
Duas filhas contam, sob outro ângulo, o que viveram de semelhante. Por duas
vezes, dor de barriga, a mãe na berlinda vai ao banheiro. O corpo fala. Volta, escuta,
compreende um tanto, sorri entre lágrimas, se acalma.
Na roda de
despedida, músicas e o que levo daqui.
Olhares complementam
as palavras. Os gestos expressam afetos. Mais próximos do que antes, nos
despedimos com abraços.
Luiz
Fernando Sarmento
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