uma vida
incomum como qualquer um 36
ficção, desarrumações
Falo das qualidades do produto, desperto seu desejo.
Omito quanto ganharei de você pelo que agora lhe vendo. Sou esperto, mais ainda
porque lucro muito. E você ainda me valoriza pelo que acumulo. Deseja ser rico
como eu.
Já nem preciso de tanto. Gasto muito de mim
na conservação do que estoco. Nem tenho prestado atenção nestas contradições
que o excesso me provoca. Ser rico dá trabalho. Fico de olho em outros que
agirão como eu se tiverem oportunidade. Gente que volta e meia muda as regras.
Ou transgride.
Eu mesmo tomo minhas providências, quando a lei
não é suficiente. Não tenho muitas dúvidas. Insônia, gastrite, hipertensão,
estas dores é que me atrapalham. E os pesadelos, os sobressaltos? Não tenho
podido usufruir do que possuo.
Tanta gente próxima pelo que tenho, que já
nem sei quem me ama pelo que sou. Minha prática em mentir nos negócios é que me
protege um pouco: reconheço logo quem também mente. Mas não tenho amado, desaprendi
reconhecer quem me ama.
Tem também estas coisas que acontecem e não entendo.
Lembro uns pedaços do que sonhei esta noite. Uma mistura de quente e frio,
vendavais, maremotos, calmarias. Túneis, desertos. Névoas e sol a pino. Ora era
eu o ator, ora desconhecidos. Minha mulher me disse que suei, gritei, chorei e ri.
Tinha pela frente uma encruzilhada quando acordei com o toque dela. Ficou esta
dúvida do que fazer com minha vida. Ai que saudades de minha inocência.
Luiz
Fernando Sarmento
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