sábado, 28 de outubro de 2017

rotina - uma vida incomum como qualquer um







uma vida incomum como qualquer um 10

rotina

Escrevo para me confortar, gostar de mim, alegrar com o que vivo e com o que vivi.


2017

só vivo
o que percebo
do que sinto

Procuro estar atento a meus sentimentos. Percebo que vivo o que sinto. E mais: só vivo o que percebo do que sinto.

Percebo, também, que um tanto do que sinto tem relação com os atos que, antes, faço. Aparentes pequenos atos definem o que, dali a pouco, sinto, sentirei.

Como exemplos, se ligo a tv, sinto indignação, raiva, tristeza, impotência. Se dou uma garfada a mais, quase certo, terei refluxo, azia, dormirei sentado. Se bebo o que não devo, ressaca. Se falo o que não devo, ouço o que não quero, brigo. Se vejo cenas de terror, sinto medo. Se triste a música, tristeza me assola.

Aprendo que sou, muito mais que imaginava, um tanto responsável pelo que sinto, pelo que vivo.

Pra mim, aprendo, não posso mentir, é assim: sou eu quem escolho o que ouço, o que vejo, o que como, o que toco, o que falo, o que faço. E o que penso. E o que sinto. E o que vivo.  Um tanto, um tantão, sou eu quem escolho o que sinto no coração.

Em síntese, como qualquer um, cientista de mim mesmo, descubro: só me percebo vivo quando sinto. E só vivo o que percebo do que sinto. Descobrir isto em mim, agora, tem me possibilitado definir, um tanto, minha vida.

Antes, 2011, até abril.
Outro dia, quase rotina. O primeiro toque do celular-despertador tem sido às seis. Depois, seis e meia, seis e quarenta e cinco. Meia hora pra espreguiçar, obnubilado nesta névoa da volta ao dia. Novo toque, se já não comecei, levanto as pernas pra cima, permaneço um pouco em cada posição, me dobro até os pés encontrarem o espaço atrás de minha cabeça.

Ao mesmo tempo, entreabertos olhos, circulo o olhar exercitando a musculatura. Pernas pra cima de novo, depois, um pouco, me aperto em posição fetal, equilibro um tantinho as pernas no ar e me curvo pra frente, sentado, as mãos segurando os pés. Sento de novo, torço meu tórax prum lado, pro outro. Repito tudo.

Levanto e faço a saudação ao sol, que Regina me ensinou. Duas vezes, intercalada com balançares de braços como li em Castañeda e como aprendi com Juracy Cançado. Rodo a cabeça, pra esquerda, pra direita, como metaleiro em show. Antes, bem antes, em algum momento, quase sempre, um e outro movimento bioenergético – bater pernas e braços como neném, balançar meu corpo deitado como geleia, focar longe e perto... – daqueles que vivi com Romel.

Sei que o terceiro toque do despertador acontece quarenta e cinco minutos depois do primeiro. Tomo um banho, faço um cafezinho, sento aqui por uma hora, uma e meia e me divirto em livre associação, se não inteira, quase.

Tenho gostado de viver. Em casa não tenho remédios. Nenhum, me orgulho. Almoço no Panela de Barro, comida leve, saladas e algo de soja ou queijo, eventualmente um arroz, feijão. De vez em quando um refresco de guaraná dito natural. E depois, descoberta, uma cocadinha de Minas, feita com ameixa ou abóbora. O vício, uns cafezinhos de máquina durante o dia, lá onde também trabalho todo dia útil, pela manhã e à tarde, oito a dez horas.

2012, feiras às terças, às vezes aos sábados.
Faço arroz, feijão pra três, quatro dias. Bem simples, só água e fogo. Preparo o almoço: na frigideira seca, terfal, um pouco de queijo curado, arroz, fogo baixo, tampo. Pico algo como salsa, cebolinha, coentro. Boto em cima do arroz. Do feijão já esquentado, pego um pouco sem caldo, acrescento.

Corto o inhame ou a batata baroa já cozida, coloco na frigideira. Tudo quente, viro de uma vez num prato grande. Pronto meu almoço. Talvez uma couve esquentada na água. Com certeza, na mesa, pimenta malagueta. É minha refeição principal, no meio do dia.

Pela manhã, mamão, eventualmente junto com banana ou abacate. Durante o dia, quando dá vontade, corto laranjas em quatro, retiro a casca com as mãos, uma delícia.

O fazedor italiano – aquele sextavado que já se tornou popular – me oferece café quente e novo umas três, quatro vezes ao dia. Água, vario, tomo pouco, sinto que deveria tomar mais um tanto.

Lavo mas não passo. Mantenho mas não varro. Molho as plantas. Cada dia tem sido novo dia.

Gasto só o que tenho. Depois de 49 anos de trabalho, salve o INSS, sou um aposentado, digamos, ativo. Mais foco no que sinto, no que penso, no que falo, no que faço. Aprendo atenção nos meus sentimentos, pensamentos, palavras e gestos.

Impressionante como volta e meia me descubro colocando pedras em meu caminho. Tropeço, dou aquela corridinha que o tropeço causa, às vezes caio. Aprendizado mais lento do que desejo. Mas, confesso, nisto dependo só de mim. Reclamações? Vou pro espelho.

Leio. Mergulho quando me toco. Alguns livros na cabeceira, minha mão vai instintivamente onde meu desejo da hora me leva. Evito televisão. Só o necessário. Lembro Freud quando ele afirma que a maioria dos sonhos tem a ver com o dia anterior. Cuido de hoje pra ter bons sonhos.

Ah! E toma de tomar banho. Alterno frio e quente. Pouco sabão. Nos cabelos, neca de xampu e condicionador, só água. Nada radical, como com a comida. Em Roma, como os romanos. Quando visito minha família mineira, como carne, ovo frito, pão de queijo. Fantasio que sei o nome da galinha sacrificada, como talvez soubesse nos tempos de infância.

Limpo os óculos várias vezes ao dia. Sabão de coco e água, ficam transparentes as lentes. De duas em duas semanas um casal amigo, Jorge, o Russo – e Eliany – dão uma geral aqui em casa. Maravilha, um auxílio luxuoso.

Hoje mesmo – que já é passado – gravo aqui em casa, só, as apresentações que faço dos programas Saiba+ que têm ido ao ar pela TV Comunitária do Rio. Tento torná-los atemporais, pra que possam ser veiculados em qualquer época. Os recheios são os vídeos-registros-documentários que realizei ou produzi, só ou com amigos e colegas. Imagino possam ser veiculados como programas de rádio, se não sem, quase sem alterações. Para gravar, sei apertar os botões básicos da câmera simples e boa que Elizeu me sugeriu. Já editar, não sei, sou suprido por profissionais amigos.

E escrevo, re-escrevo, de acordo com os sentimentos que variam em mim. O FGTS que recebi quando fui demitido do Sesc Rio tem sido a base para as despesas extras, como a impressão do livro, a edição dos programas. Já financiou parte das despesas com um Blogspot onde reúno quase tudo que me exponho, textos e links. E em página do Youtube (que o Videolog me oferecia, não me oferece mais), disponibilizo quase todos os vídeos.

Já o desejado sofá, só quando entrar um dinheiro extra de um trabalho extra. A vida simples, mas boa, do dia-a-dia, o salário simples de aposentado garante.

2017.
Muda tudo. Como só vegetais. E gosto muito. Sem óleos nem gorduras. Um luxo. Voltam gostos e sensações de infância, adolescência. Salinas, Montes Claros vêm à memória.


Luiz Fernando Sarmento








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