uma vida incomum como qualquer um 25
Proibição de emoções
Acredito
no ser humano recém-embrionado como totalmente original, sem nenhum
comportamento de origem moral. As regras que vai absorvendo têm suas fontes em
seus modelos, que são as pessoas ao seu redor, a vida ao seu redor.
Acredito
ainda que a cada regra pode corresponder uma limitação de atuação do novo ser.
E esta atuação deformada, pressionada de fora - ou esta atuação suprimida -
gera sentimentos, emoções. Que podem ser de raiva, medo... Estas emoções, por
sua vez, necessitam ser expressas.
Assim,
muitas vezes, quando são expressas estas emoções e sentimentos -
percebidos
socialmente como coisa ruim - acontece de serem proibidas por outros seres
humanos com quem convive este novo ser. E, em função destas proibições, o novo
ser tende a se sentir incomodado, ridículo, inseguro.
A
partir de então, para evitar estas desagradáveis sentimentos reativos, o novo
ser aprende a evitar as emoções originais, geradoras de atuações de repressões
externas. O novo ser evita as emoções originais, internaliza a repressão.
Como
evita as emoções? Alterando a respiração natural, enrijecendo a parte do corpo
que for necessária enrijecer para que a emoção seja suprimida. Até que a
repetição constante deste enrijecimento torne a parte do corpo cronicamente
enrijecida – quando da sensualidade do requebro, por exemplo, parando de
requebrar, endurecendo a musculatura pélvica. Para sossego dos pais (viado meu
filho não vai ser!), da igreja (alma em estado de graça, assexuado, sem
pecados, passivo e submisso...), do quartel (homem tem que ser duro), dos que
exploram (operários escravos).
Recuperar
o jogo dos quadris, outras sensações, sentimentos e emoções, implica numa
recuperação da mobilidade da parte do corpo enrijecida.
Trabalhar
o corpo, a cabeça, recuperar a flexibilidade perdida tem sido difícil, às vezes
quase impossível. Acredito – pelas vivências sinto - que recuperar emoções,
sentir emoções pode ser inicialmente doloroso. Em seguida, atraente, gostoso,
gratificante.
E
quando as emoções gostosas pintam, as ações são mais produtivas. Soluções mais
claras, humor mais leve, comportamentos mais racionais. E quando do avesso, da
contenção de emoções, restam mesquinharia, burrice, mau humor invadindo a vida.
Agir,
alterar comportamentos já rotineiros, recuperar as próprias emoções, acredito
ser a base para a tentativa de trabalhar pela autonomia de outros seres
humanos, emocionáveis como nós.
Certeza
absoluta, nenhuma: o que aqui tento relatar tem a intenção de passar
informações a pessoas que detêm o poder de refletir. São anotações pessoais,
frutos da observação constante: acredito que possam representar verdades.
O
texto acima, escrevi em 1981, em Maputo, Moçambique, quando lá atuava como
cooperante no Instituto Nacional de Cinema. As sacações, abaixo, escrevi nos
últimos anos, à medida que me vinham ao coração.
Pra ler no banheiro
* Falsas notícias, repetidas, repetidas, repetidas... dão, ao
falso, vida.
* Sexualidade castrada, a liberdade mina. Quem castra, domina.
* Tanto abraço contido, tanto beijo escondido, tanto manto me
encobre, que faço, que faço? Me disfarço, sério, escondo meus mistérios? Ou rio
de mim, me faço palhaço?
* Autocrítica, antes da crítica.
* Satisfeito, aceito, sou homem. E, como outro qualquer, também,
um tanto mulher.
* As meninas que se beijam, em plena felicidade, mexem com minha
sexualidade. Se bem fazem a si, e mal fazem a ninguém, que mal que tem?
* Reflito, confesso, um tanto me meço, evito conflito.
* A sete palmos, quando sob o mármore, calmo, calmo, calmo,
espero, virarei árvore. Já quando pó, eu só, sem dó, alimento a planta que me
suplanta.
* Tanto escolheram que não me viram. Perderam. Tanto pré-concebi
que não te vi. Perdi.
* Idade terna, eterna idade. Leveza no ser, pura beleza.
Espiritualidade.
* A vida que vivo – pensamentos, sentimentos, falas, meus atos –
de fato, decorrem de escolhas que faço.
* No caminho da felicidade, vale a boa vontade.
Luiz
Fernando Sarmento
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