terça-feira, 31 de outubro de 2017

mais ou menos um dia - uma vida incomum como qualquer um 13






uma vida incomum como qualquer um 13
   

mais ou menos um dia

2016
Um tanto, um pouco coleciono o que me vem claro ao coração. Um turbilhão. Bom, me sinto dono de mim mesmo. E compartilho, talvez, com outros corações.

* Meu Deus, pura empatia, se alegra com minha alegria.

* Não é que eu não tenha tempo pro prazer. É que escolho outras coisas pra fazer.

* Que alívio. Minhas escolhas determinam o que vivo.

* Racionalizo tudo. A emoção emerge e prevalece.

* E sinto tantas metas. Só não tenho a hora certa.

* A criança que vive em mim implora: viva sim, viva agora.

* Será sempre assim, inesperado, o fim?


Posses
Tudo muito bem, tudo muito certo. Reconheço, já não tenho meu tempo. Descobri, maduro, que não sou eu que tenho as coisas, são as coisas que me têm.

O carro que não tenho me obrigaria cuidá--lo, guardá-lo, emplacá-lo, mantê-lo. O animal que não tive me pede atenção, cuidados. O dinheiro requer guarda, controle. O que guardo nas prateleiras, no guarda-roupas me pede limpeza, arrumação. Tudo me pede tempo. Se não pede, toma.

Hoje, ainda, como não tenho meu tempo, corro. Na minha infância não soube de faltas até o momento em que, na cidade maior, vi a vitrine. Desejei o que não tinha. E por muitas vezes me angustiei por não me suprir das novas necessidades criadas. Só agora compreendi que o que aparentemente possuo é que me possui. Minhas posses me aprisionam.

Foi bom tê-las – estas coisas que me têm – e agora deixá-las a uma e outra. Por mim, hoje, só conversaria, escreveria, filmaria, espreguiçaria, deixaria o saudável inesperado vida me levar. Muito do que me impede é minha carência, que me faz querer ser reconhecido, admirado, mesmo eu sabendo que – se minha autoestima depender do olhar de outros – posso eu próprio não me reconhecer. Como diz o Adalberto, o que você quer que eu queira, pra eu querer?

Misturas
Cultura, o que é? Antonio Faundez lembra Paulo Freire e se identifica com o que ele dizia que descobrir uma cultura é aceitar outra cultura, tolerá-la. E afirma que a cultura é mais do que manifestação artística ou intelectual através do pensamento. Sua manifestação mais profunda está nos gestos simples do cotidiano, como os diferentes jeitos de comer, dar a mão, relacionar-se com o outro.

Eu próprio, quando leio Faundez, o escuto impregnado de minha própria cultura. Já não é mais Faundez puro. Somos agora misturados, inclusive a Paulo Freire.


Winnicott dedicou a vida à pediatria e à psicanálise, especialmente a infantil. Fez, nos últimos anos de vida, palestras para os públicos mais diversos. Tudo Começa em Casa é o título do livro póstumo que contém estas palestras. Cada capítulo se encerra em si mesmo. Sua leitura tem me facilitado a vida, um tanto pela melhor compreensão de mim mesmo, outro tanto pela compreensão do outro, mamãe inclusive. E meus lados mãe, pai, filho.

Luiz Fernando Sarmento










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