uma vida incomum como qualquer um 13
mais ou menos um dia
2016
Um tanto, um pouco
coleciono o que me vem claro ao coração. Um turbilhão. Bom, me sinto dono de
mim mesmo. E compartilho, talvez, com outros corações.
* Meu Deus, pura
empatia, se alegra com minha alegria.
* Não é que eu não
tenha tempo pro prazer. É que escolho outras coisas pra fazer.
* Que alívio.
Minhas escolhas determinam o que vivo.
* Racionalizo tudo.
A emoção emerge e prevalece.
* E sinto tantas
metas. Só não tenho a hora certa.
* A criança que
vive em mim implora: viva sim, viva agora.
* Será sempre
assim, inesperado, o fim?
Posses
Tudo muito bem,
tudo muito certo. Reconheço, já não tenho meu tempo. Descobri, maduro, que não sou
eu que tenho as coisas, são as coisas que me têm.
O carro que não
tenho me obrigaria cuidá--lo, guardá-lo, emplacá-lo, mantê-lo. O animal que não
tive me pede atenção, cuidados. O dinheiro requer guarda, controle. O que
guardo nas prateleiras, no guarda-roupas me pede limpeza, arrumação. Tudo me
pede tempo. Se não pede, toma.
Hoje, ainda, como
não tenho meu tempo, corro. Na minha infância não soube de faltas até o momento
em que, na cidade maior, vi a vitrine. Desejei o que não tinha. E por muitas
vezes me angustiei por não me suprir das novas necessidades criadas. Só agora
compreendi que o que aparentemente possuo é que me possui. Minhas posses me
aprisionam.
Foi bom tê-las –
estas coisas que me têm – e agora deixá-las a uma e outra. Por mim, hoje, só conversaria,
escreveria, filmaria, espreguiçaria, deixaria o saudável inesperado vida me
levar. Muito do que me impede é minha carência, que me faz querer ser
reconhecido, admirado, mesmo eu sabendo que – se minha autoestima depender do
olhar de outros – posso eu próprio não me reconhecer. Como diz o Adalberto, o
que você quer que eu queira, pra eu querer?
Misturas
Cultura, o que é?
Antonio Faundez lembra Paulo Freire e se identifica com o que ele dizia que
descobrir uma cultura é aceitar outra cultura, tolerá-la. E afirma que a
cultura é mais do que manifestação artística ou intelectual através do
pensamento. Sua manifestação mais profunda está nos gestos simples do
cotidiano, como os diferentes jeitos de comer, dar a mão, relacionar-se com o
outro.
Eu próprio, quando
leio Faundez, o escuto impregnado de minha própria cultura. Já não é mais Faundez
puro. Somos agora misturados, inclusive a Paulo Freire.
Winnicott dedicou a vida à pediatria e à psicanálise, especialmente a infantil.
Fez, nos últimos anos de vida, palestras para os públicos mais diversos. Tudo
Começa em Casa é o título do livro póstumo que contém estas palestras. Cada
capítulo se encerra em si mesmo. Sua leitura tem me facilitado a vida, um tanto
pela melhor compreensão de mim mesmo, outro tanto pela compreensão do outro, mamãe
inclusive. E meus lados mãe, pai, filho.
Luiz
Fernando Sarmento
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